Solange ou a maçã no escuro
 

“As imagens que cria são ao mesmo tempo surpreendentes e vagamente familiares”. A frase é de Vera Pedrosa e é o que de melhor encontro em quanto se escreveu até hoje sobre Solange Magalhães... Realmente se qualquer tentativa de verbalização do seu trabalho pecará sempre pela omissão de algum dado importante, esse será o clima difuso que sua pintura respira, somente perceptível pela direta e recolhida contemplação visual. “É uma pintura sem compromisso com escola nenhuma”, diz Clarice Lispector, que chega perto de uma representação verbal dessa arte requintadíssima quando distingue nela “a limpidez misturada à fantasia solta, livre e misteriosa”.
Da amostra na antiga Goeldi até a atual do Grupo B temos o desdobramento de várias proposições visuais que tornaram talvez seu trabalho menos acessível a muitos. Não estamos, entretanto, diante de um hermetismo que esgote em si sua razão de ser. A troco de não ser fácil essa pintura oferece aos não muito numerosos capazes de penetrá-la um clima de envolvimento que o desenho – extremamente cerebral – ou a composição – rigorosamente econômica – não dão a ver a um primeiro olhar.
Mesmo a cor, onde principalmente nos tons quentes essa pintura se permite um diálogo menos severo com o observador, é ainda um elemento trabalhado dentro de uma visão estética
Sem um mínimo de concessão. E porque sua nobre linguagem cromática e composicional instala seus climas de lirismo muito para além do fácil e dos artifícios, a recolhida, quase esotérica, beleza do seu trabalho é algo a ver e rever, consistindo numa das mais importantes mostras que tivemos ultimamente.

Ruy Sampaio – “A Crítica” Rio 1974